02 outubro 2012

O Poço


Cais, às vezes, afundas em teu fosso de silêncio, em teu abismo de orgulhosa cólera,  e mal consegues
 voltar, trazendo restos  do que achaste  pelas profunduras da tua existência.

Meu amor, o que encontras  em teu poço fechado?
 Algas, pântanos, rochas?
 O que vês, de olhos cegos,  rancorosa e ferida?

Não acharás, amor,  no poço em que cais  o que na altura guardo para ti:  um ramo de jasmins todo orvalhado,  um beijo mais profundo que esse abismo.
Não me temas, não caias  de novo em teu rancor.
 Sacode a minha palavra que te veio ferir  e deixa que ela voe pela janela aberta.
 Ela voltará a ferir-me  sem que tu a dirijas,  porque foi carregada com um instante duro  e esse instante será desarmado em meu peito.

Radiosa me sorri  se minha boca fere.
 Não sou um pastor doce  como em contos de fadas,  mas um lenhador que comparte contigo
 terras, vento e espinhos das montanhas.

Dá-me amor, me sorri  e me ajuda a ser bom.
 Não te firas em mim, seria inútil,  não me firas a mim porque te feres.


Pablo Neruda

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